sexta-feira, 27 de novembro de 2009

"CLT Flex”: Direito do Trabalho ganha “itens de série”

O título do presente artigo poderia ser facilmente confundido com os corriqueiros anúncios de jornais que tratam de compra e venda de automóveis, demonstrando suas virtudes frente a seus concorrentes e informando ao consumidor final as razões para adquirir certa marca. Os opcionais “de série” também poderiam ser postos à escolha do cliente e para cada bolso – leia-se interesse - existiria um respectivo pacote. Assim, na hipótese aventada, empregados e empregadores de comum acordo declarariam que, dentro do pacto laboral, certa porcentagem corresponde aos direitos celetistas e outro montante à prestação de serviços, com variações em face dos ramos, cargos e funções inerentes a cada atividade. Ocorre que, por mais absurda que pareça essa idéia, o termo “CLT Flex” – de flexível ou com flexibilidade - vem se propagando entre empregadores e empregados e demonstra uma completa deturpação da norma celetista vigente e desrespeito a princípios basilares do Direito. Há ainda quem defenda a possibilidade de aplicar esse regime, sem qualquer prejuízo às partes envolvidas – empregados e empregadores – com citações de leis e doutrinas que em tese comprovam a licitude dessa medida. Inicialmente, deve-se destacar a diferença e a finalidade entre o contrato de prestação de serviços e o contrato de trabalho celetista. No contrato de prestação de serviços, uma das partes se obriga com a outra a exercer determinada atividade, mediante pagamento, utilizando-se do Código Civil para regular a relação jurídica, sem pessoalidade ou dependência econômica e, por conseqüência lógica, não gerando qualquer vínculo de emprego. Já o contrato de trabalho celetista é o negócio jurídico pelo qual uma pessoa física se obriga, mediante remuneração, a prestar serviços, não eventuais, a outra pessoa – física ou jurídica - sob a direção exclusiva dessa e respeitando a CLT. Assim sendo, não há no ordenamento jurídico vigente a forma híbrida dos dois contratos, ou seja, legalmente a prestação deverá ser feita de uma forma ou de outra, não coexistindo ambas na mesma relação. A criação da “CLT Flex” é totalmente desamparada de legislação, doutrina ou jurisprudências. A idéia desse instituto – se assim podemos denominá-lo – encontra-se no fato de que, em uma relação de emprego, parte do pagamento é feito com as deduções dos encargos trabalhistas e parte é feito com deduções de prestação de serviços a pessoas jurídicas. Para ilustrar melhor a situação, pode-se dizer que em um determinado contrato de trabalho o empregado receberá 60% de seu salário de acordo com a CLT – com as devidas anotações em CTPS, recolhimentos fundiários, fiscais, previdenciários etc. – e o restante pagos “por fora”. Os empregados que em um primeiro momento gozam de salários líquidos “maiores” em seus contracheques mensais perdem suas garantias futuras como aposentadorias, fundo de garantia e demais verbas que pleiteiem em reclamações trabalhistas, uma vez que o valor estará abaixo do que realmente lhes era devido. A prova do valor real torna-se mais difícil e as implicações pela omissão podem trazer desdobramentos catastróficos aos empregados e seus dependentes. Já os empregadores devem ater-se ao fato de que certo tipo de economia não os resguarda ou garante qualquer direito. Economizar porcentagens em recolhimentos fiscais e previdenciários não é o melhor mecanismo de conter folhas de pagamento “cheias” ou reduzir passivo trabalhista. Talvez, os valores deduzidos sejam acalentadores em um curto prazo, mas certamente no futuro essa economia pode transformar-se em uma grande crise interna de difícil reversão. Por fim, cabe às esferas Judiciais e Legislativas encontrar mecanismos para coibir esse tipo de desdobramento. E aos magistrados, após verificar a falta de coação e a má-fé de ambas as partes, aplicar penas e sanções igualitárias. O Legislativo deveria adotar preceitos modernos ao Direito do Trabalho, reformando a arcaica lei laboral. E no campo tributário serem contempladas com incentivos as empresas que trabalham de forma correta, beneficiando assim os empregados e os empregadores. A CLT não distingue se um determinado funcionário irá receber ou não adicional de insalubridade e ainda se determinada pessoa merece ou não ganhar hora extra. Se as circunstâncias margeiam o adicional devido ou o pagamento extraordinário, todos os que estão nessa situação recebem o que é devido. A modalidade Flex não pode sobrepor-se ao Diploma Celetista e não é saída para amenizar encargos de empregados e empregadores. Deve-se destacar que a correta adoção da legislação laboral vigente por meio de incursões preventivas ainda é o melhor caminho para resguardar infortúnios trabalhistas. É nítido, portanto, que a utilização do regime “Flex” gera temor na relação de emprego e por consequência deturpa as garantias dos empregados e dos empregadores. Nesse aspecto, vale destacar que ambos são coniventes nessa situação e em momento algum a culpa deve recair em face de um ou outro. Aqui não se aplicam os princípios do “in dúbio, pro operario” e/ou da hipossuficiência, mas, sim, margeia-se a criação do princípio da culpa recíproca. (Alan Balaban Sasson, Advogado)

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