Apesar de todo o entusiasmo pelas novas tecnologias e o aparato promocional cercando o carro elétrico, a realidade se mostra bem diferente. Os motores a combustão interna (MCI) que consomem etanol, gasolina, diesel ou gás natural têm e terão, no mínimo em médio prazo, um papel bastante relevante a cumprir. Mesmo nos híbridos (motores a combustão e elétrico em série ou em paralelo), com ou sem carregamento de bateria na tomada (plugged in), há dificuldades pelo alto preço e infraestrutura. Afinal, faltam tomadas e medidores nas garagens de prédios para os plugados.
Em 2009, se prevê um bom ano para os híbridos. Porém, nada além de 2% a 3% das vendas totais de automóveis e comerciais leves nos EUA, o maior mercado para esse tipo de veículo. No Japão e na Europa a procura cresce, sem supera aquele percentual. Nas pesquisas, o consumidor médio – não tão ligado em questões ambientais – interessa-se pelos híbridos, mas desanima quando faz as contas de quanto pagará a mais e a longa quilometragem a percorrer para amortização. Esse fenômeno já ocorre nos EUA. A queda brusca do preço da gasolina desacelerou a procura. Projeções indicam pelo menos cinco anos até a participação dos híbridos dobrar para 6%.
No Brasil, o assunto ainda está no campo da curiosidade. A Mercedes-Benz planeja importar algumas unidades do S400h, seu topo de linha na versão híbrida, no começo de 2010. Na Argentina, a Toyota acaba de vender algumas unidades do Prius, o híbrido de maior sucesso. A empresa não escolheu o Brasil, ressaltando que teria de fazer algumas modificações no motor a combustão e o preço seria muito alto, além de não representar vantagem na emissão de CO2 se comparado ao etanol.
Otto versus Diesel
No MCI há dois ciclos termodinâmicos mais conhecidos: Otto (etanol, gasolina e gás) e Diesel (só aplicável com óleo diesel). Outro ciclo possível, o de Atkinson, de 1882, começa a ser considerado, em especial nos veículos híbridos. Mais adiante tem quem aposte na tecnologia HCCI (sigla, em inglês, para Ignição por Compressão de Carga Homogênea), que permitiria o uso tanto de gasolina/etanol como diesel, porém com grande vantagem para os dois primeiros. Gás natural também poderia se usar, mas a infraestrutura de abastecimento e os tanques são obstáculos financeiros a superar.
Entre diesel e gasolina/etanol há uma clara cisão no mundo. Segundo a revista Ward’s, as diferenças começaram ainda nos anos 1970. Os europeus se concentraram em economia de combustível e os americanos em combustíveis baratos e menos poluentes. A Europa procurou nos MCI a diesel também uma opção estratégica: avançou com os turbocompressores e injeção direta de galeria única (common rail), deixando o desenvolvimento de motores de ciclo Otto um pouco de lado. Cerca de 50% dos automóveis europeus vendidos em 2008 eram a diesel. A participação caiu em 2009 porque seu preço maior não atraiu os que aproveitaram incentivos governamentais para trocar um carro muito velho por um novo.
O fato é que mais de 70% das vendas mundiais de automóveis e veículos leves concentram-se em motores a gasolina ou etanol. O ciclo diesel promove combustão inerentemente “suja”. Consegue-se limpá-lo a um custo alto e “muletas” como filtro de particulados e injeção de ureia no escapamento. A seu favor, a economia de combustível que se reflete em emissão menor de CO2, atual vilão no mundo.
No entanto, as próximas exigências ambientais nos países centrais, quanto a material particulado (MP) e óxidos de nitrogênio (NOx), encarecerão ainda mais os motores a diesel. Os MCI do ciclo Otto não emitem MP e a baixa emissão de NOx se controla com um catalisador barato. Resta diminuir o consumo e a consequente emissão de CO2. Vários fabricantes já acordaram para essa realidade. Investem para diminuir a vantagem de 20% a 25% no consumo de diesel, em relação à gasolina, para algo em torno de 10% e ainda se mantendo mais barato.
Melhoras à vista
Há muito ainda a avançar. Algumas conquistas já chegaram, porém ainda se necessita trabalhar para baixar custos e viabilizar escala de produção. A mais evidente é o downsizing: diminuição de cilindrada acompanhada de superalimentação por meio de turbocompressores ou compressores centrífugos. Em combinação com a injeção direta proporciona ao ciclo Otto boa economia de combustível e ótimo desempenho. A Ford vai aplicar o que chama de Ecoboost em 90% de seus motores até 2012. A Volkswagen, com seus TFSI, foi pioneira. Nos motores flex utilizando etanol os ganhos são ainda maiores.
Eliminar a borboleta de aceleração ajuda a diminuir as perdas por bombeamento. A BMW usa esse recurso (Valvetronic) nos motores de ciclo Otto. A Fiat Powertrain Technologies (FPT) lançou agora o sistema Multiair de controle eletro-hidráulico das válvulas de admissão que funciona com injeção indireta ou direta. A economia de combustível é de 10%. Ao mesmo tempo crescem potência (10%) e torque (15%), além de diminuir emissões tóxicas. Também se aplicaria ao diesel, mas os ganhos são pouco marcantes: estes já não possuem a borboleta de aceleração.
O próximo passo é a ascensão de motores de três cilindros nos próximos anos. Eles já existem, mas serão bem aperfeiçoados graças às novas tecnologias. Volkswagen, Ford, BMW, Mercedes-Benz, Peugeot-Citroën e Nissan anunciaram essa tendência e a Fiat objetiva também os de dois cilindros. As marcas japonesas já se posicionaram a favor dos MCI Otto. A Nissan desenvolve injetores duplos por cilindro, solução mais barata que a injeção direta em motores de baixo custo. Eliminar velas de ignição, substituindo-as por raios laser, vem sendo pesquisado na Universidade de Liverpool, com apoio da Ford inglesa. Será outro grande salto tecnológico em relação ao ciclo Diesel.
Desligar e religar o motor de forma automática nos congestionamentos (stop/start), com economia superior a 10% em muitos casos, é um recurso que se estima alcançar 50% dos carros vendidos na Europa até 2012. Sistema de recuperação de energia em frenagens também crescerá, demonstrando que os MCI ainda tem um longo reinado à frente. (Fernando Calmon)
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